Em entrevista ao jornalista Fernando Rodrigues, da "Folha de S. Paulo", em 6 de setembro de 2006, o ministro declarou que não há lei que contenha essa regra e que ela também inexiste na Constituição. De fato, a Lei 9.504/97, que estabelece as normas para as eleições no país, deixa claro em seus artigos 2 e 5 que se contam somente os votos válidos, excluídos os brancos e nulos.
Por válidos, entendem-se aqueles dados aos candidatos regularmente inscritos no pleito. Vale a pena ressaltar, então, que a legislação em vigor igualou os votos brancos e nulos que, anteriormente, não eram a mesma coisa. Antes da vigência dessa lei, nas eleições proporcionais (para cargos no poder Legislativo), os votos brancos e nulos tinham significados e efeitos diferentes.
Voto branco e voto nulo
O voto em branco era uma espécie de "tanto faz" por parte do eleitor, que cedia seu voto aos candidatos que obtivessem maioria. Já o voto nulo era, na verdade, um voto de protesto. Significava que o eleitor não referendava a eleição por considerá-la ineficaz ou inexpressiva da sua vontade.
Por isso, o movimento estudantil fez uma campanha pelo voto nulo em 1970, num dos momentos mais violentos do regime militar que vigorava no país. A lógica por trás da campanha era a de que as eleições para cargos legislativos serviam apenas para dar uma aparência democrática à ditadura, que proibira, por outro lado, as eleições para os cargos executivos (presidente, governador e prefeitos das cidades grandes).
Naqueles tempos, portanto, o voto nulo não deixava de ser uma escolha política. Nesse sentido, as origens do voto nulo remontam ao movimento anarquista da virada dos séculos 19 e 20. Por alimentar o sonho de uma sociedade autogerida, que prescindida de Estado, o anarquismo considerava que votar nulo era uma forma de se recusar a entregar a própria liberdade nas mãos de um líder ou de qualquer autoridade.
Cacareco e macaco Tião
Por falar em anarquistas, vale lembrar que o espírito gozador do povo brasileiro costumava se manifestar com criatividade no momento da anulação dos votos. Em 1958, o hipopótamo Cacareco, recém adquirido pelo Zoológico paulista, foi a opção da maioria dos que optaram por anular o seu voto para vereador no município de São Paulo.
Da mesma maneira, em 1988, os integrantes do grupo Casseta & Planeta lançaram com relativo sucesso a candidatura do macaco Tião, do Zoológico do Rio de Janeiro, para prefeito da cidade. Hoje, com a urna eletrônica, esse tipo de deboche já não é possível. Quem quiser anular seu voto deve teclar um número inexistente - o que pode acontecer também por um erro na hora de manipular o teclado.
Direito ou dever?
Sobre o ato de votar, porém, há uma questão mais interessante a ser colocada e que o Datafolha apresentou em pesquisa de intenções de voto realizada em 22 de agosto de 2006. Afinal, o voto é um direito ou um dever do cidadão? Se é um direito, como acredita um número expressivo de juristas, ele deveria ser facultativo e não obrigatório.
A pesquisa do Datafolha constatou que 50% dos brasileiros são contra o voto obrigatório, 45% a favor, 4% indiferentes e 1% não sabem o que dizer sobre o assunto. O assunto é de fato controverso e deve estar em pauta no caso de se proceder efetivamente a reforma política de que o Brasil tanto necessita.
Aqui, o voto foi tornado obrigatório e considerado um "dever cívico" a partir da Constituição de 1934. Isso, porém, tinha um motivo bem prático: acabar com as fraudes eleitorais da República Velha, em que o alistamento eleitoral era determinado pelos coronéis e chefes políticos locais.
Em democracias de peso como os Estados Unidos, o Reino Unido e a França, o voto é facultativo. Por outro lado, em países não menos democráticos como a Austrália, a Itália e a Bélgica também vigora, como aqui, a obrigatoriedade do voto.
*Antonio Carlos Olivieri é escritor, jornalista e diretor da Página 3 Pedagogia & Comunicação. olivieri@pagina3ped.com
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